Duas obras do historiador Joaquim Veríssimo Serrão (falecido em 2020) acabam de ser publicadas em segunda edição. Os livros em causa, “Ensaio histórico sobre o significado e valor da tomada de Santarém aos mouros em 1447” e “Santarém na História de Portugal”, têm edição do Centro de Investigação Professor Doutor Joaquim Veríssimo Serrão (CIJVS) e foram lançadas este sábado, dia 24 de Abril, numa sessão realizada no Salão Nobre da Câmara Municipal de Santarém.

Segundo Adriana Serrão, filha de Veríssimo Serrão, tratam-se de duas obras que testemunham o início “de uma carreira intelectual dedicada à investigação, profunda, demorada e muito rica”.

“São publicações que vêm enriquecer o CIJVS”, afirmou, uma vez que se tratam de ensaios que têm vertidos “uma investigação dedicada à história de Santarém”.
“São livros que permitem, agora, reler e compreender a História de Santarém enquanto História local e não deixam de abrir perspectivas para a integração entre essa mesma história local e a história mais geral”, analisou Adriana Serrão.

“Numa altura em que estamos na chamada época da globalização, em que nos sentimos perdidos enquanto indivíduos, um pouco como ‘toupeiras electrónicas’, esta proposta de estudar a História de Santarém na sua integração com um aspecto mais geral é algo de diferente: trata-se de levar a sério e a fundo um estudo demorado e atento, a discussão de ideias que tanta falta faz”, referiu.

Segundo afirmou, este enlace entre o local e o geral não teria sido possível “sem a convergência de tantos esforços”, nomeadamente a equipa técnica do CIJVS, que conseguiu fazer uma segunda edição destes livros que reproduz “de uma forma fiel” a primeira.

A edição destes livros foi possível graças ao mecenato cultural de Manuel Oliveira, membro do CIJVS e antigo aluno da Escola Industrial e Comercial de Santarém.
“Ao constatar que não estava acessível esta obra do distinto Professor Joaquim Veríssimo Serrão, ofereci ao Centro a possibilidade de custear a sua reedição, o que faço com enorme prazer”, declarou, manifestando-se “sensibilizado por tao alta distinção”.

“Veríssimo Serrão e Santarém são referencias essenciais na minha vida. O grande historiador, pela sua mente brilhante, mas também pelo seu caracter íntegro, verdadeiro arquétipo a seguir. Santarém porque foi aqui que despertei para o Mundo Maravilhoso do Conhecimento, como aluno da sempre saudosa Escola Industrial e Escola Industrial e Comercial de Santarém, na inesquecível década de 60”, afirmou nesta sessão.

“Trata-se de uma obra que assinala a entrada do Professor Joaquim Veríssimo Serrão no Jardim dos Livros de História, Jardim onde veio a plantar algumas das mais brilhantes árvores do conhecimento do passado. Ainda aluno, mas evidenciando já a enorme paixão pela História e o não menor amor à sua Santarém querida, matrizes fundamentais da sua vida frutuosa. Assim sendo, cumpre tornar acessível esta obra, permitindo ao leitor comum o contacto com um espírito tão brilhante quanto probo. Veríssimo Serrão transporta consigo a grandeza de quem fala do passado respeitando escrupulosa e exaustivamente as fontes. A sua linguagem é encantadora, emotiva — escrita com alma — sem deixar de ser objectiva. Com o Tejo a seus pés, como em 1147, a geografia e as gentes que fizeram esta urbe magnífica, continuarão a condicionar e a ser condicionadas por Lisboa. Talvez este livro pioneiro seja um excelente ponto de partida para uma reflexão mais alargada sobre o papel insubstituível e único deste “Nilo Ibérico”, nunca esquecendo que sem água não temos Tejo! Precisamos, hoje como ontem, de espíritos curiosos e perscrutadores do passado, sem o que teremos mais dificuldade em delinear as rotas do futuro. Ajudar a editar trabalhos do Professor é, a nosso ver, uma das mais nobres formas de o homenagear”, afirmou, ainda, Manuel Oliveira.

Para Vítor Serrão, historiador de arte e filho de Veríssimo Serrão, estas duas obras são uma verdadeira referência: “são obras fundamentais da carreira do meu pai, escritos quando ele tinha apenas 21 anos, onde mostra já uma visão holística e metodológica” da Historiografia.

“Operário de memórias”, Veríssimo Serrão, nestas obras, revela “uma nota de paixão, de rigor e de frescura”, que caracterizou todo o seu percurso de investigação: “não é uma historiografia fechada numa torre de marfim. Permite, antes, reconstruir a memória da história com rigor e perspectiva de futuro”, afirmou Vítor Serrão.

Com a reedição destas obras, o Centro de Investigação Professor Doutor Joaquim Veríssimo Serrão diz estar a “honrar o trabalho” feito pelo historiador que emprestou o seu nome a este centro que, nas palavras do seu director, Martinho Vicente Rodrigues, “além de congregar enorme e desejável diversidade, torna-se prioritariamente numa oportunidade relevante para um salutar intercâmbio entre pesquisadores”.

“Homem de cultura, que não recua diante de dificuldades e obstáculos”. É desta forma que o director do CIJVS se referiu ao seu “mestre de sempre”.

Para Martinho Vicente Rodrigues, “não há dúvida” de que Veríssimo Serrão “é um dos grandes historiadores portugueses”, um reconhecimento patente nas muitas condecorações de que foi alvo, em Portugal (recebeu a Grande Cruz da Ordem de Santiago da Espada), mas sobretudo no estrangeiro, nomeadamente em Espanha, de que destaca o Prémio Príncipe das Astúrias de Ciências Sociais (1995).

“A história de Veríssimo Serrão não pode fazer-se de silêncios”, disse ainda Martinho Vicente Rodrigues.

“O Centro de Investigação Joaquim Veríssimo Serrão continua o labor incansável desse grande mestre, com dignidade e largueza de espírito e de olhos postos na dimensão internacional”, disse, considerando que “Santarém não pode esquecer este seu filho tão ilustre”.

“Não envelheceu ainda a lição clássica, de que as terras se enobrecem pelo nome dos seus filhos, de todos aqueles, que pela vida e pelo exemplo, deram lustre ao seu berço. Felizmente a História é o veículo que trava o combate contra o esquecimento”, referiu o responsável.

Centro de investigação assinala uma década

Criado a 1 de Março de 2011, o Centro de Investigação O Centro nasceu de um acordo celebrado em Novembro de 2009, altura em que Joaquim Veríssimo Serrão decidiu doar à autarquia a sua biblioteca pessoal. Posteriormente, esse fundo documental foi transferido para a Casa de Portugal e de Camões (antigo Presídio) mas, agora, dez anos volvidos sobre a abertura ao público, estende-se “a todo o mundo” e vai constituindo um novo fundo documental.

Para além dos 30 mil volumes da biblioteca pessoal de Veríssimo Serrão, são colocados à disposição dos investigadores, curiosos e interessados pela História, os milhares de ficheiros que constituíram as “alfaias” do trabalho desenvolvido ao longo de uma vida, bem como 90 caixas de manuscritos, entre os quais a correspondência que trocou com Marcello Caetano, condecorações, telas, que legou à cidade onde nasceu.

Uma vida dedicada à História e à Investigação

Nomeado em Dezembro de 1960 1º Assistente da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, após a licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas por Coimbra (1947), o doutoramento em 1953 em Toulouse em cuja Universidade foi Leitor de Cultura Portuguesa durante uma década, um novo doutoramento em Ciências Históricas em Coimbra em 1956, ascende à cátedra em Lisboa em 1972 e desenvolve uma renovada docência no Departamento de História criando novos percursos curriculares ao nível da licenciatura, dos mestrados e dos doutoramentos nas áreas de História Moderna, Cultura Moderna, Cultura Portuguesa, História da Expansão Portuguesa e História do Brasil. Como Director do Instituto Histórico Infante D. Henrique dá nova vida à criação do Professor Doutor Manuel Heleno e, na direcção do Centro de História, garante o lugar cimeiro que este centro de investigação granjeara com os Professores Doutores Virgínia Rau e Jorge Borges de Macedo. O seu percurso na Universidade de Lisboa culmina em 1973, ano em que ascende a Reitor desta Universidade. Dos seus reconhecidos méritos como académico e cientista falam as numerosas distinções recebidas.

A edição destes livros foi possível graças ao mecenato cultural de Manuel Oliveira,
membro do CIJVS e antigo aluno da Escola Industrial e Comercial de Santarém

Doutor Honoris Causa pela Universidade Paul Valéry de Montpellier em França (1974) e pela Universidade Complutense de Madrid em Espanha (1995), é membro efectivo da Academia das Ciências de Lisboa, da Academia Portuguesa da História –onde detém a Presidência de Honra após um quarto de século como presidente efectivo –, da Associação dos Arqueólogos Portugueses, do Instituto Português de Arqueologia, História e Etnografia, do Instituto Histórico do Estado de Guanabara, da Académie du Monde Latin de Paris e da Académie des Sciences, Inscriptions et Belles Lettres de Toulouse, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da Academia Brasileira de Letras, da Academia de História Nacional da Venezuela, da Academia de História e Geografia do Paraguay. É, ainda, Membro Correspondente da Conférence permanente des Recteurs, des Présidents et Vice-chanceliers des Universités Européènnes, com sede em Genebra, entre outras instituições.

De destacar, também, duas outras facetas: a sua acção como fundador e director do Centro Cultural Português da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, de 1967 a 1972 e a presidência da Comissão Instaladora do Instituto Politécnico de Santarém, de 1980 a 1984.

Das numerosas condecorações e outras distinções que lhe foram conferidas, referência para a Grã-Cruz da Ordem de Santiago da Espada (2006) em Portugal, a Grã-Cruz da Ordem Civil de Alfonso X el Sábio (1995) em Espanha e a Comenda da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul (1967) e a Medalha de Ouro da Universidade de S. Paulo (1993) no Brasil. Em 2007 Veríssimo Serrão recebia a Medalha de Mérito da Universidade de Coimbra outorgada na Biblioteca Joanina em 19 de Abril desse ano.

Da sua investigação e da sua produção historiográfica de mais de 400 títulos merecem especial destaque os temas da História de Portugal e da expansão portuguesa e peninsular, o erguer do humanismo moderno, as relações culturais com as universidades de Espanha e de França, as figuras mais marcantes da historiografia nacional, o regionalismo português, e a História do Brasil dos séculos XV a XVIII.

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