Tiago Fernandes é um músico de 28 anos de idade, nascido e criado em Santarém. É licenciado em Artes Plásticas e tem um mestrado em Gestão Cultural. Ao longo dos anos tem criado, desenvolvido e estado ligado a projectos culturais que têm pretendido mobilizar e desenvolver o tecido artístico local, bem como, todos os seus agentes, dos artistas ao público. Este ano teve um 25 de Abril bem diferente: deu um concerto em sua casa em directo no Facebook, na noite de 24 para 25 e lançou um vídeo de homenagem à música de Zeca Afonso onde lançou vivas a Abril e à Liberdade!
O que representa, para si, a Revolução dos Cravos?
Um momento a repetir. Todos os dias. Em diversas situações da vida pessoal, social, política e profissional. Não podemos esquecer que, do escuro, se fez claridade, com a astúcia de diferentes personalidades da vida portuguesa, em diferentes campos de batalha. Mas, teria sido completamente diferente, sem a fortíssima importância que os artistas tiveram no “alerta” que transmitiram às pessoas.
Qual foi, na sua opinião, a maior conquista de Abril?
Sem dúvida, a Liberdade de Expressão. Em todos os campos, mas muito importante para a Expressão Artística e Cultural, que vezes sem conta foi reprimida pelo anterior regime.
Como é que nasce o seu gosto pelo mundo da música?
Pelo que me contam, desde pequeno que trauteava música pela casa, infantário, ruas e cafés. Ao longo do tempo, comecei a explorar a música ouvida e tocada, o que me levou a criar uma ligação forte com a música portuguesa.
Considera importante ensinar aos mais jovens o que foram os tempos da ditadura do Estado Novo em Portugal e o que representou a revolução de 25 de Abril de 1974?
Mais do que importante, considero necessário. Não saber o que é ter que viver calado, sem poder publicamente expressar as suas opiniões se estas forem opostas às do “sistema”, é uma dádiva para todos nós que nascemos depois deste histórico momento. Mais do que aprender o que foi a ditadura, o importante, julgo, é tentar equiparar alguns desses momentos com outros da nossa vida contemporânea. A cada dia que passa, surgem ameaças que sugerem retrocessos civilizacionais que só seremos capazes de identificar se tivermos connosco o conhecimento do que foi o passado. Neste caso, um passado recente, que nos alerta para perigos com que somos confrontados diariamente.
De onde vem o seu gosto pela interpretação de autores de intervenção?
Desde criança que me lembro de ouvir, ver e ler esses autores. A preocupação pelos outros, pela vida comum, pela liberdade, é o que mais me motiva nos mesmos. Cantando-os nunca estou a falar de mim mas sim da história que temos em comum e que construímos diariamente. Assim, a expressão musical, tem sido a aliada que me permite intervir social e politicamente usando a arte como processo de intervenção cultural. As palavras desses autores permitem uma forte ligação entre o que é dito e o que é feito. Quando interpreto um poema ou uma música, estou necessariamente a interligar o conteúdo escrito a algo que aconteceu ou que luto para que aconteça.
Tem uma grande ligação às canções e ao músico Zeca Afonso. Como explica esta relação musical?
O Zeca Afonso é o pai de todo este alfabeto de criadores de obras de Liberdade. Sinto que as suas canções têm uma expressão de vida vivida, de preocupação e que na sua obra encontramos tudo e todos. O Eu, o Outro, o Nós e também o Eles estão presentes para nos alertar da importância que todos temos no lugar onde estamos e como podemos intervir. Gostaria de não isolar o Zeca de todos os outros, os que fisicamente já partiram, os que cá continuam e também todos os que vão aparecendo, usando a música de protesto, como gosto de lhe chamar, para intervir na sociedade, pois sem esses e outros que o divulgam, o nome Zeca, nunca teria tido a projecção que hoje tem. Essas quatro letras – ZECA – formam uma bandeira que devemos juntar a outra, curiosamente com quatro letras também – MAIA. Bandeiras representadas por dois Homens que, juntamente com muitos outros Homens e Mulheres, levaram a cabo a difícil missão de iluminar o País com a chama da Liberdade.
Para si a música é um instrumento para a liberdade?
Qualquer género de expressão, individual ou colectiva, artística ou científica, é um instrumento para a liberdade. Mas o que tem que estar presente em todos nós, antes de tudo, é a Liberdade de Pensamento.