Jorge Maia foi árbitro durante 22 anos e desde 2016 que é o Presidente do Conselho de Arbitragem (CA) da Associação de Futebol de Santarém (AFS). Nos últimos anos, a AFS tem colocado cada vez mais árbitros nos escalões principais de futebol do País, o que para o dirigente é demonstrativo da sua qualidade e também uma “referência a nível nacional”. O quadro de árbitros da Associação de Futebol de Santarém é composto esta época por 128 árbitros de futebol, 29 de futsal e 16 novos árbitros que terminaram recentemente a fase teórico-prática do curso de formação inicial e que passaram a integrar também o quadro. Constam também deste quadro 10 observadores de futebol, 2 de futsal e 5 árbitros de futebol de praia.
Que balanço faz do seu primeiro mandato à frente do Conselho de Arbitragem (CA) da Associação de Futebol de Santarém?
Faço uma avaliação bastante positiva. A avaliação é diária e feita pelos árbitros. Iniciámos funções em 2016 com um Conselho de Arbitragem jovem, misto de árbitros experientes que conheciam o terreno e já vivenciados no meio, com outros elementos de áreas complementares. Além disso, todos os agentes envolvidos na arbitragem do distrito têm o objectivo comum de trabalharem em prol da mesma. Desde a Associação de Futebol de Santarém, da qual temos um apoio incondicional do presidente Francisco Jerónimo e da equipa que lidera, ao Núcleo de Árbitros de Futebol do Ribatejo Norte e Núcleo de Árbitros da Lezíria do Tejo, nas pessoas dos presidentes Ana Brites e Nelson Andrade. Não esquecendo as autarquias, que disponibilizam todas as infra-estruturas, criando todas a condições aos árbitros para a sua evolução nas vertentes técnica e física nos Centros de Treino de Futebol em Almeirim e Entroncamento, e no Futsal em Almeirim e Torres Novas. Temos um suporte administrativo competentíssimo, parte integrante da nossa estrutura, só desta forma é possível conseguirmos fazer um trabalho de qualidade. O sucesso do trabalho realizado por qualquer Conselho de Arbitragem está sempre dependente do sucesso dos árbitros: se os seus desempenhos forem positivos, a competição é quem mais beneficia.
Iniciou em 2020 o segundo mandato no CA. Que objectivos tem para cumprir?
Temos vários objectivos que gostaríamos de cumprir. Em primeiro lugar, consolidar o trabalho que temos vindo a fazer até ao momento, depois aumentar o recrutamento de novos árbitros e melhorar o número de retenção, evitando que haja mais abandonos devido à pandemia que nos assolou. Este é dos objectivos mais importantes de qualquer Conselho de Arbitragem porque, apesar do número razoável de árbitros que este Conselho tem, continua a ser um número insuficiente para as exigências dos fins-de-semana. Também gostaria de manter, como até aqui, nomeações para todos os jogos das jornadas das competições distritais e garantir aos árbitros todas as condições para que nada lhes falte no desempenho das suas funções. Apesar de termos em funcionamento três Centros de Treino, só os dois de futebol são financiados pela Federação Portuguesa de Futebol, pelo que futuramente iniciaremos o processo de financiamento do Centro de Treino de Futsal junto do CA da FPF. É ainda fundamental que os jogadores e restantes agentes desportivos conheçam de forma mais profunda as Leis de Jogo. Deste modo, futuramente, tentaremos promover acções mais regulares junto dos clubes.
Recentemente foram formados 16 novos árbitros na AFS. Isso é um sinal de vitalidade da arbitragem na região?
Sem dúvida! Tendo em conta os tempos que estamos a atravessar, haver muita juventude disposta a novos desafios, é de louvar. Temos novos árbitros das várias zonas do distrito, o que permite fazer uma gestão mais equilibrada dos nossos recursos. Este foi um curso muito especial. Desde que iniciámos em Outubro, tivemos várias interrupções devido à pandemia mas conseguimos que todas a sessões fossem realizadas presencialmente. Claro que a transmissão dos conhecimentos foi diferente, bem como a forma de entendermos se estão a assimilar as leis e regulamentos.
A FPF tem intenção de alargar o ensino da arbitragem às escolas. É um passo fundamental neste processo de recrutamento?
Sim, o processo de recrutamento nas escolas é fundamental. O Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol já iniciou junto das escolas esse processo, que será feito em articulação com os respetivos Conselhos de Arbitragem distritais e regionais. De salientar que este CA, o NAFRN e o NALT, em anos anteriores já iniciaram este trabalho.
Abrir a arbitragem e aproximá-la das pessoas é um passo importante para o reconhecimento da classe?
A classe da arbitragem é reconhecida. A opinião pública desde sempre pergunta porque é que os árbitros não falam no final dos jogos como os jogadores e treinadores. Seria o ideal que alguns dos árbitros que dirigem os jogos das competições profissionais pudessem vir a estar presentes nas conferências de imprensa, após os desafios onde actuam, dizendo de sua justiça. Naturalmente que seriam os árbitros mais experientes. Mas a nossa sociedade não está preparada para ouvir o árbitro dizer que tomou esta ou aquela decisão, mesmo que errada, e no fim-de-semana seguinte a mesma coisa. A nossa sociedade e, principalmente os adeptos mais fervorosos dos clubes, nunca aceitarão um erro que prejudique a sua equipa. A comunicação entre a estrutura da arbitragem e os adeptos será feita de forma equilibrada. Outro dos pontos que podemos falar é a possibilidade de se abrir as comunicações entre árbitro e videoárbitro (VAR), em tempo real. Neste momento, isso é muito difícil colocar em prática. No futuro, esta é a forma de dar maior transparência e credibilidade ao VAR. São situações que o Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol está a estudar, é um processo gradual e que requer muita ponderação. As pessoas já se adaptaram à introdução do VAR. O erro vai continuar a acontecer, mas os erros grosseiros com VAR, diminuíram drasticamente. Agora é necessário aperfeiçoar a máquina.
Na sua opinião, o que deve ser feito para acabar com o clima de suspeição em torno dos árbitros? A Federação Portuguesa de Futebol e o Governo têm aqui um papel importante?
Houve nos últimos anos uma acalmia no que respeita ao clima de suspeição em torno da classe. Há responsabilidades de todas as partes nestas questões. Todos temos que alterar comportamentos que são nossos, enquanto técnicos, jogadores, dirigentes e árbitros. Mas não são só estes que devem alterar comportamentos. Esta responsabilidade é transversal: os media, as comunicações dos clubes, os próprios programas televisivos pós-jogo e dias seguintes são os maiores incendiários neste tipo de polémicas, que esmiúçam ao pormenor todos os lances, o que me leva a concluir que esta não será uma guerra fácil de combater.
A introdução do VAR nos jogos de futebol foi importante? Considera que devia ser alargado a mais campeonatos, como a segunda liga e os campeonatos amadores?
A implementação da vídeo-arbitragem nas nossas competições profissionais veio credibilizar a arbitragem e o nosso futebol. Apesar de todo o ruído em volta das decisões mais polémicas tomadas pelas equipas de arbitragem, os erros grosseiros diminuíram drasticamente. Para termos uma ideia, antigamente o adepto dizia que era inconcebível o árbitro não ver determinado lance. Hoje, o árbitro já está ilibado disso e passam as responsabilidades para o vídeo-árbitro, esquecendo-se que continuam a ser pessoas a tomar decisões e a ter opiniões sobre os mesmos. A função de VAR é muito específica. É preciso tempo, treino e aprendizagem, para serem cumpridas várias directrizes inseridas no protocolo estabelecido para a função. Quanto ao alargamento da vídeo-arbitragem aos restantes campeonatos, claramente dizia que sim. Mas a vídeo-arbitragem é um processo que tem um custo de actividade muitíssimo elevado e, neste momento, é impraticável e insustentável um modelo que consiga ter a vídeo-arbitragem em níveis diferentes.
Os últimos anos coincidiram com os melhores registos da arbitragem distrital ao nível da colocação dos seus elementos em patamares superiores, como é o caso da Liga NOS. Na sua opinião, o que tem contribuído para este desfecho?
Desde 2015 que a arbitragem teve uma grande evolução. Os árbitros neste momento têm uma carreira muito exigente, desde testes escritos, teste de inglês, avaliação do seu índice de massa corporal, vídeo-teste, presenças obrigatórias nos centros de treino, acções de formação creditadas, preparações para provas escritas, sessões práticas, apresentações nos núcleos, sessões nos núcleos. Ser árbitro requer muita disponibilidade e bastante sacrifício. Efectivamente, viemos exigir mais dos árbitros, o que veio melhorar os seus desempenhos e, acima de tudo, a sua qualidade. Por consequência, o trabalho por eles desenvolvido, mais tarde ou mais cedo, tinha que se reflectir nos patamares superiores, com a presença de dois árbitros na liga profissional, João Bento e Hugo Silva, um árbitro assistente, Carlos Covão, e Pedro Sousa no quadro de assistentes de acesso à liga profissional. No futsal, com Toni Pereira na Liga Placard e Fábio Carapuça na categoria imediatamente a seguir. Quanto aos restantes árbitros dos quadros nacionais têm tido prestações de relevo, prevendo-se no futuro resultados positivos. A arbitragem de Santarém é referência a nível nacional.
Qual é o seu desejo para o futuro da arbitragem em Santarém?
Pessoal e profissionalmente, desejo melhorar o trabalho até aqui desenvolvido, para que este Conselho de Arbitragem possa, num futuro próximo, ter árbitros no patamar internacional, e que possa ver representado o nome de Santarém na categoria mais alta do quadro feminino.