A associação Materiais Diversos está a convidar antigos combatentes residentes no distrito de Santarém a participarem na criação do espectáculo “Amores Pós-Coloniais”, que a companhia Hotel Europa começará a preparar em Julho no concelho do Cartaxo.
Elisabete Paiva, directora artística da Materiais Diversos (MD), disse à Lusa que a companhia vai realizar uma residência artística em Pontével, no concelho do Cartaxo, de 17 a 23 de Julho, aproveitando a concentração de várias pessoas regressadas de África na zona, a que quer juntar antigos combatentes na guerra colonial, numa “reflexão sobre como se vivia o amor, o que era ou não permitido, relações legítimas e ilegítimas, os filhos que nasceram dessas relações”, que servirá de base para o espectáculo a estrear no início de 2019.
A ‘open call’ (abertura de chamada) para ex-combatentes – em facebook.com/materiaisdiversos.associacaocultural – surgiu da percepção de que estes são “pouco chamados a falar e, quando são, é sempre sobre o combate, a perda”, sendo objectivo conhecer as suas experiências “mais do lado afectivo, amoroso, seja sobre a relação com as namoradas que ficaram cá, seja com as que deixaram lá”, disse.
Os directores da Hotel Europa, André Amálio e Tereza Havlíčková, convidaram o casal Selma Uamusse (moçambicana) e Toni Fortuna (português) para a criação musical de um espectáculo que “inicia um novo capítulo de investigação na companhia, estendendo o ciclo de investigação ao colonialismo ao tema do amor”.
Elisabete Paiva afirmou que “Amores Pós-Coloniais” será o quarto espectáculo de teatro documental da companhia sobre esta temática, depois de “Portugal não é um país pequeno” (sobre os chamados “retornados”), “Passa-Porte” (a chegada, os documentos) e “Libertação” (sobre o conflito armado).
A directora artística da MD salientou que a residência artística que vai decorrer no Centro Cultural de Pontével será uma das três programadas pela associação para Julho na região, sendo que o Teatro do Vestido irá fazer um trabalho de pesquisa no concelho de Alcanena e Maurícia Neves (dança) estará no Centro Cultural do Cartaxo.
Elisabete Paiva disse à Lusa que este será o primeiro ano sem o Festival Materiais Diversos, que se realiza desde 2009 na região, iniciativa que passa a ter uma duração bienal, de acordo com um “redesenho do projecto” que será apresentado a 21 de Setembro, em Minde (Alcanena), coincidindo com a data em que a iniciativa deveria acontecer.
A existência de “muita programação regular”, que a MD assegura nos concelhos de Alcanena e Cartaxo, “aproximando e envolvendo diferentes públicos e artistas em acções de pesquisa, residências, oficinas, ensaios abertos e espectáculos” é uma das razões para esta alteração na periodicidade do festival, a par do surgimento de novos projectos, como os “Filhos do Meio”, explicou.
Este projecto, criado exclusivamente para o distrito de Santarém, para pessoas do ou a viver neste território, resulta da “consciência de que as condições são diferentes para quem trabalha fora dos grandes centros”.
Contando com as parcerias do Museu de Aguarela Roque Gameiro, em Minde, e do festival Bons Sons, de Cem Soldos (Tomar), onde os dois primeiros trabalhos contemplados com uma bolsa da MD serão apresentados (em Julho e Agosto), a qualidade das candidaturas foi “uma agradável surpresa”.
Um dos projectos apoiados pela bolsa de criação artística “Filhos do Meio” está a ser desenvolvido pela coreógrafa Susana Gaspar com grupos folclóricos das serras d’Aire e Candeeiros, com a participação de Edgar Valente, que se tem dedicado à investigação de músicas tradicionais.
No outro, “Senso”, do Colectivo 249, jovens da área das artes visuais estão a fazer inquéritos na zona de Torres Novas e de Alcanena, em vários formatos, “para compreender melhor a ligação” da população à cultura, num trabalho que inclui a troca de objectos e de que resultará uma instalação, acrescentou.
A Materiais Diversos apresenta-se como “uma associação cultural sem fins lucrativos que incentiva a investigação e experimentação artísticas” e que “tem como missão atrair e sensibilizar múltiplos públicos para as artes performativas, com especial enfoque na dança contemporânea”.