As indústrias de curtumes que utilizam processos químicos mais agressivos no tratamento das peles, suspeitos de estarem na origem dos maus cheiros que têm afectado o concelho de Alcanena, devem concluir alterações nos sistemas até ao final do mês.
A presidente da Câmara Municipal de Alcanena, Fernanda Asseiceira, disse à Lusa que, na sequência da mais recente crise ambiental – com cheiros descritos como insuportáveis, ao longo de todo o dia, de Junho a Outubro de 2017 -, tem estado a ser implementado nas unidades industriais um conjunto de medidas, em articulação com a Associação de Utilizadores do Sistema de Tratamento de Águas Residuais (AUSTRA) e o Centro Tecnológico das Indústrias do Couro (CTIC), que visam a resolução do problema na sua origem.
Com um prazo de conclusão no final deste mês, foram introduzidas alterações nas 22 unidades identificadas como tendo no seu processo produtivo o caleiro (tratamento para retirar o pelo e a carne que vem agarrada às peles e que implica um processo químico mais agressivo, com utilização de sulfuretos ou componentes amoniacais, associados aos cheiros intensos sentidos pela população).
“Esse controlo tem que ser feito a nível do processo produtivo, do pré-tratamento, para evitar libertar para o sistema águas carregadas com essas componentes ou com outras, como gorduras ou pelos que resultam desse processo e que acabam por causar grandes constrangimentos e tornar mais difícil a eficácia dos equipamentos”, tanto dos que transportam (os colectores), como dos que têm o objectivo de tratar (Estação de Tratamento de Águas Residuais), e, na fase final do processo, controlar as lamas que depois são depositadas em aterro, disse a autarca.
Esta é uma das acções previstas no plano definido para este ano pelo Observatório Ambiental, criado em Janeiro por iniciativa do município e integrando “todas as entidades que, directa ou indirectamente, têm responsabilidades e competências” nesta área, salientou.
Entre as iniciativas assumidas pelo município, conta-se a monitorização regular da qualidade do ar – aguardando-se relatório da que foi realizada no final de Maio -, bem como a auditoria feita à ETAR e ao aterro (aguarda-se também relatório).
Vão agora avançar as análises aos efluentes das 22 unidades sinalizadas com o processo produtivo quimicamente mais agressivo, disse.
Fernanda Asseiceira disse à Lusa que o município tem estado a reunir toda a documentação e a prova factual relativa a este processo para, se a área jurídica confirmar a existência de indícios que configurem as bases para apresentação de uma queixa crime, fazer uma participação ao Ministério Público.
“Não podemos esquecer que o que aconteceu em 2017 foi realmente muito grave”, disse, sublinhando que, depois de todo o investimento realizado em 2015 na requalificação da rede de colectores, na ETAR e no aterro, estava convicta de que este tipo de situações não se voltaria a repetir.
“Fui claramente apanhada de surpresa. Foi um balde de água fria que recordo com grande preocupação e insatisfação. Não contava. Sobretudo com a dificuldade que todos tivemos, por um lado, em identificar a origem ou origens e, por outro lado, em conseguir evitar que se repetisse noutros momentos, noutros dias”, afirmou.
Para Fernanda Asseiceira, o que aconteceu nos meses que antecederam as eleições autárquicas de Outubro “foi inexplicável, porque era todos os dias, de manhã, à tarde, à noite”.
A autarca sublinhou que a intervenção do município na área ambiental vai para além deste “problema mais visível”, incidindo tanto na qualidade do ar como na da água, desde a ribeira dos Carvalhos, a montante e a jusante, até à nascente do Alviela nos Olhos d’Água, onde se têm detectado problemas de poluição provocada por lagares.
Fernanda Asseiceira afirmou que está em análise se esta poluição é provocada por lagares existentes noutros concelhos, estando a trabalhar com os municípios de Porto de Mós e de Santarém, ou se existem lagares de Alcanena a adoptarem a “prática indevida e até criminosa de utilizarem algares”.